A matéria da qual o ser humano é feito e, na contabilidade entre os bons e os maus, talvez os bons – aqueles que se interessam, aprendem, escapam aos preconceitos, aceitam o Outro e o diálogo – estejam a perder. E assim perdemos todos.
Parece-me que em Portugal, infelizmente, a falta de civismo, a fraca educação e os preconceitos andam cada vez mais à solta.
Neste país que tanto louvamos por ser de brandos costumes, andamos todos enganados. As pessoas são agredidas por terem outra cor de pele – Vai para a tua terra! – ou por serem de outra nacionalidade – Idiota, é brasuca! – ou por serem deficientes – Não venha para a rua atrapalhar! – entre outras pérolas.
Estes episódios sucedem-se e, na época da hiper comunicação, as denúncias fazem-se, geram indignação e depois… acabou, passamos para o próximo episódio infeliz que, em Portugal, tem tendência para implicar a morte de mais uma mulher às mãos do marido, ex-companheiro, namorado. A crise económica, e a pandemia, exacerbaram comportamentos egoístas e centrados na necessidade de proteger o Eu, o que é meu, as minhas posses, as minhas ideias.
São tempos perigosos em que os exercícios populistas vingam e demoram a combater. São tempos em que o tecido moral das comunidades é exposto com maior transparência de atitudes e, por isso, torna-se evidente o que é racismo, homofobia, discriminação, sexismo, abuso. Nos últimos dias tivemos vários episódios desta natureza, que incendiaram as redes sociais e os media em geral. Existirão decerto outros que não chegarão ao público. Muitos mais, porventura, até com dimensões de maior hostilidade.
Uma amiga espanhola, mulher interessante, a trabalhar na área do teatro há muito tempo, e que trabalhou também em Portugal durante oito anos, garantia-me que aqui, neste nosso paraíso, há mais civismo, mais cuidado do que no país vizinho. Cada um vive e fala a partir da sua experiência, do meio onde circula, das pessoas com quem convive. Parece-me que em Portugal, infelizmente, a falta de civismo, a fraca educação e os preconceitos andam cada vez mais à solta. Talvez a questão não seja a identidade cultural de cada povo; os portugueses têm características admiráveis, os espanhóis idem; talvez seja mesmo a matéria da qual o ser humano é feito e, na contabilidade entre os bons e os maus, talvez os bons – aqueles que se interessam, aprendem, escapam aos preconceitos, aceitam o Outro e o diálogo – estejam a perder. E assim perdemos todos.
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