segunda-feira, 20 de abril de 2015

A SUBVERSÃO DO MUNDO MODERNO.


Os episódios trágicos à volta do fluxo de migrantes no Mediterrâneo multiplicam-se. Lampedusa, Líbia, Rhodes – tudo pontos de uma teia que não pára de crescer. Do Papa à União Europeia, as vozes levantam-se a pedir soluções para um fenómeno que já provocou a morte de 40 mil pessoas nos últimos 15 anos.

Uma sucessão de naufrágios nos últimos dias voltaram a pôr os olhos do mundo no mar Mediterrâneo. No domingo, entre 700 a mil migrantes foram dados como desaparecidosao tentarem chegar às praias de Itália. Horas depois, as notícias de mais dois naufrágios: um ao largo da ilha grega de Rhodes, com dezenas de migrantes, e ainda um mais recente, também no Mediterrâneo, com mais de 300 pessoas a bordo.
Em 2014, registaram-se 3.279 mortes no Mediterrâneo, segundo dados da Organização Internacional para as Migrações (OIM). Foi o ano mais mortífero desde 2000.
Mas 2015 pode ser ainda pior. A OIM regista já cerca de 1.600 mortes, ressalvando que já dá como mortos 700 migrantes que naufragaram no domingo ao largo da Líbia. Relatos de um sobrevivente deram conta que a embarcação transportaria perto de mil pessoas a bordo.
Outro factor a ter em conta é que a OIM só contempla os dados reportados, ou seja, a contabilidade pode pecar por defeito por não incluir dados de possíveis naufrágios que tenham ocorrido sem serem noticiados ou registados.
Com a chegada da Primavera e do tempo ameno, teme-se que o fluxo migratório proveniente do Norte de África e do Médio Oriente se acentue. Calcula-se que o número de migrantes desembarcados no ano passado em Itália (170 mil) seja ultrapassado em 2015.
Com a conta a ultrapassar as 40 mil vítimas desde 2000, a OIM apela aos governos de todo o mundo para que enfrentem aquilo que descrevem como "uma epidemia de crime e vitimização". "Está na altura de fazer mais do que apenas contar o número de mortes", declarou o director da OIM, William Lacy Swing.
Mais de um ano e meio depois do início da operação "Mare Nostrum", em Outubro de 2013, já foram salvos mais de 100 mil migrantes que naufragaram ao tentar atravessar o Mediterrâneo para a Europa a partir de África à procura de melhores condições de vida.
A operação foi lançada depois da tragédia ao largo da ilha italiana de Lampedusa, que matou 366 migrantes.
Preocupação global
Ao longo das últimas semanas, as vozes que se têm levantado a alertar para este gigante problema têm-se multiplicado. Entre elas, a do Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas, que declara que, sem uma operação de larga escala, "muito mais pessoas" vão morrer no Mediterrâneo
O Papa Francisco, que tem feito deste tema um ponto forte do seu pontificado, reconheceu o esforço de Itália no acolhimento destes migrantes e lamentou a tragédia de domingo.
O eurodeputado português Paulo Rangel defende a criação de uma guarda fronteiriça para acautelar o fluxo de migrantes. Já o presidente da AMI, Fernando Nobre, alerta que "o que está a acontecer no Mediterrâneo é apenas a ponta de um icebergue". 
A alta representante da Política Externa da União Europeia, Federica Mogherini, admite que a União Europeia já está "sem desculpas" e tem "o dever político e moral" de dar resposta à crise no Mediterrâneo. Esta sexta-feira, os ministros dos Negócios Estrangeiros da UE reúnem-se no Luxemburgo para avaliar a situação.
A jornalista da Renascença Catarina Santos tem acompanhado o tema e assina o especial multimédia "A Sul da Sorte". Deu também conta de uma entrevista a dois gémeos sírios que descrevem os horrores da travessia, mesmo quando acaba bem.

CONVINCENTE - 29ª JORNADA BELENENSES-BENFICA 0-2



sexta-feira, 17 de abril de 2015

DOENÇA DOS VIKINGS

Rev Port Ortop Traum 21(3): 313-322, 2013

Doença de Dupuytren

Uma visão atual sobre a doença

Sara Machado

Serviço de Ortopedia e Traumatologia. Centro Hospitalar de S. João. Porto. Portugal.


Sara Machado

Interna do Complementar de Ortopedia Assistente Convidada de Anatomia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

Serviço de Ortopedia e Traumatologia Centro Hospitalar de S. João

Submetido em: 22 fevereiro 2013 Revisto em: 19 agosto 2013 Aceite em: 19 agosto 2013

Publicação eletrónica em: 23 setembro 2013

Tipo de Estudo: Terapêutico
Nível de Evidência: IV

Declaração de conflito de interesses:

Nada a declarar.

Correspondência:

Sara Machado

Serviço de Ortopedia e Traumatologia Centro Hospitalar de S. João Alameda Prof. Hernâni Monteiro 4200 319 Porto


RESUMO

A doença de Dupuytren, descrita pela primeira vez há centenas de anos, continua a ser protagonista numa evolução constante de conhecimentos. Trata-se de uma patologia fibroproliferativa da mão, potencialmente progressiva e incapacitante, de clara predisposição genética. Novos conhecimentos surgiram no âmbito da anatomia e patofisiologia, com implicações na abordagem terapêutica. Várias estratégias de tratamento foram propostas nos últimos anos assim como vários foram os estudos que as tentaram avaliar. Foi realizada uma pesquisa no pubmed/medline com as palavras “Dupuytren disease”, selecionando sobretudo artigos publicados nos últimos 5 anos, incluindo artigos originais e de revisão, tendo por objetivo reunir os conhecimentos mais recentes nas várias dimensões da doença, nomeadamente procurando clarificar o papel dos vários métodos de tratamento disponíveis na atualidade.

INTRODUÇÃO

A doença de Dupuytren (DD) foi descrita há mais de 400 anos pelo médico suiço Felix Plater[1], embora mais reconhecida a partir da descrição do anatomista e cirurgião francês Baron Guillaume Dupuytre em 1831, o primeiro a descrever o tratamento cirúrgico desta patologia[2]. Trata-se de um tumor desmóide/ fibromatose palmar resultante da fibroproliferação dos tecidos, podendo conduzir à contração em flexão incapacitante da mão, impossibilitando o doente de realizar as mais simples atividades da vida diária.

EPIDEMIOLOGIA

A prevalência da DD aumenta com a idade, sendo mais frequente a partir dos 40 anos, com o ratio homem/mulher podendo atingir o valor de 5,9:1. A prevalência da DD é extremamente variável de acordo com a localização geográfica, sendo superior no Norte da Europa (ficou conhecida como a “doença dos Vikings”) e incomum na Ásia e África. Os valores variam de 0,2% até 56%, para o que pode contribuir fatores genéticos, ambientais ou uma combinação de ambos[3,4,5].

ANATOMOPATOLOGIA

É fundamental compreender a complexa anatomia da fáscia palmar (Figura 1) para a correta avaliação e tratamento da doença. A fáscia palmar divide-se em três partes – digital, palmodigital e palmar, dividindo-se esta última nas aponevroses radial, cubital e central (a mais diretamente envolvida na doença). Longitudinalmente, a aponevrose central organiza-se distalmente nas bandas pré-tendinosas, que se bifurcam inserindo-se na derme, nas estruturas flexoras e extensoras dos dedos, e em torno da articulação metacarpo-falângica profundas aos feixes neuro-vasculares originando as bandas espirais que emergem posicionando-se laterais aos feixes. Da aponevrose central, além das fibras longitudinais, partem também fibras verticais – fibras de Grapow e septos de Legueu e Juvara - e transversais – ligamento transverso superficial, proximalmente e ligamentos natatórios, distalmente[6,7].

Na DD as bandas e ligamentos sãos, por fibroproliferação, transformam-se em tecido doente, designado por nódulos e cordas.

No quadro I são descritas as principais deformidades associadas a cada corda.



Quadro I. Deformidades associadas à doença de Dupuytren.

Corda
Deformidade
Cordas pré-tendinosas
Flexão MCF
Cordas espirais
Flexão MCF+IFP
Cordas natatórias
Limitação da abdução dos dedos
Cordas centrais
Flexão IFP
Cordas laterais
Flexão IFP+IFD




MCF- articulação metacarpo-falângica;

IFP- articulação interfalângica proximal;

IFD- articulação interfalângica distal

Os conhecimentos que se foram adquirindo até à data sobre a anatomia da fáscia palmar têm implicações não só na compreensão da doença mas também no aperfeiçoamento da técnica cirúrgica. O desenvolvimento das cordas, nomeadamente das cordas espirais, pode deslocar os feixe neuro-vasculares para a linha média do dedo, que assim pode ser lesado durante a incisão na pele na ausência do conhecimento dessa possível posição anómala do feixe por parte do cirurgião.


Figura 1. Anatomia da fáscia palmar.

ETIOLOGIA

A DD resulta de uma simbiose entre fatores genéticos e ambientais.
Genética: Há uma clara predisposição genética para o desenvolvimento da DD. Acredita-se que se trate de Transmissão Autossómica Dominante com Penetrância Variável.
Inicialmente foi proposta uma associação ao cromossoma 16q, onde se localizarão genes envolvidos na produção do colagénio. Pensa-se que na doença haja uma superativação dos genes responsáveis pela produção de colagénio e inibição dos genes responsáveis pela sua destruição[8]. Posteriormente, foram reportadas alterações no número de cópias dos genes nas regiões cromossómicas 10q22, 16p12.1 e 17p12, associações com o alelo HLA-DRB1*15 e uma mutação no rRNA 16s. Foram ainda demonstradas associações genéticas com os cromossomas 6 e11[5,9,10].
Embora ainda haja um longo caminho a percorrer no campo da genética na DD, todas as associações estabelecidas contribuirão para uma via fisiopatológica comum que em última análise resulta na fibroproliferação tecidular caraterística da doença.

Ambiente Tabaco e Álcool

Estudos demonstraram que o tabaco e o alcoolismo elevam o risco de desenvolver a doença, com um odds ratios de 2,8:1 e 1,8:1 respetivamente[5,11,12].


Diabetes mellitus

Associações estatisticamente significativas foram também efetuadas entre a DD e a Diabetes mellitus(DM), tipo I mais que a tipo II. Num estudo de Noble, Heathcote and Cohen a incidência da doença nos diabéticos foi de 43%. A idade de início e a duração da DM é significativa no desenvolvimento da DD. Após 20 anos, 67% dos diabéticos tipo I desenvolveram DD[5,11,12].


Outras associações

Menos consistente é a associação da DD com a epilepsia/medicação antiepilética, HIV e trabalho manual, com exceção no trabalho manual implicando vibração da mão. Dois estudos apresentaram evidência de uma relação dose-resposta para a associação com a exposição à vibração[5,11,12].

PATOFISIOLOGIA

Na DD o tecido da fáscia palmar apresenta um aumento na deposição de colagénio tipo III relativamente ao colagénio tipo I (principal componente da fáscia palmar saudável).

Foram descritos 3 estadios para a doença - proliferativo, involucional e residual - que possui dois elementos fibróticos estruturalmente distintos: o nódulo, altamente vascularizado e rico em miofibroblastos que expressam a α- actina típica do músculo liso , e as cordas, mais avasculares, acelulares, ricas em colagénio III e pobres em miofibroblastos. A expressão da α-actina pode explicar a contratilidade observada na DD. Os nódulos podem transformar-se em cordas com a progressão da doença. Inicialmente pensava-se que as cordas seriam totalmente acelulares, estáticas e o produto final dos nódulos, contudo estudos mais recentes demonstraram que os nódulos podem estar presente no seio das cordas em graus variáveis, que possuem assim ainda alguma celularidade.

O miofibroblasto desempenha um papel central na DD, e partilha caraterísticas com as células do músculo liso e os fibroblastos, conduzindo à contração e deposição de colagénio III típicas da doença. Vários mediadores inflamatórios estão aumentados nos tecidos da DD como o fator transformador de crescimento (TGF- ß), fator de crescimento dos fibroblastos (FGF), fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), fator de crescimento epidérmico (EGF) e interleucina-1 (IL-1), sinalizando a diferenciação e proliferação dos miofibroblastos. Estes mediadores inflamatórios são libertados em resposta radicais livres de oxigénio que por sua vez se originam devido a fenómenos isquémicos secundários a uma angiopatia microvascular. Esta lesão microvascular terá origem multifatorial, com contribuição de fatores genéticos, idade, sexo, tabaco, álcool diabetes mellitus ou trauma[5,13 14,15]. Portanto segundo os estudos mais recentes, todos os fatores etiológicos citados anteriormente culminam numa via comum aqui descrita e resumida na Figura 2.



Figura 2. Fisiopatologia da doença de Dupuytren.

APRESENTAÇÃO CLÍNICA

Inicialmente há um espessamento e retração da pele, que adquire um aspeto enrugado, com reentrâncias, o que não deve ser confundido com calosidades. Posteriormente os doentes podem notar o surgimento de nódulos. Estes são habitualmente distais à prega de flexão distal da palma e indolores, embora alguns doentes refiram sensibilidade ao toque, sensação de prurido ou queimor. Com o desenrolar da doença os nódulos podem progredir para cordas estáticas, contraídas e fixas à pele subjacente podendo lembrar o aspeto de tendões flexores, e nos estádios
mais avançados da doença conduzir à flexão, por vezes incapacitante, dos dedos[16]. O doente pode ser incapaz de colocar a mão reta sobre uma mesa – “table top test”/teste de Hueston (Figura 3) É importante não confundir os estádios mais precoces da DD com outras patologias, por exemplo hiperqueratose, tenosinovite estenosante, entre outras[17].
Por ordem decrescente de frequência, o dedo mais atingido é: anelar, 5º dedo, 3º dedo, 2º dedo, e por fim1ºdedo.A flexão da articulação MCF normalmente precede a flexão da articulação IFP. Geralmente a doença inicia-se na palma e propaga-se para os dedos, mas é possível estar apenas na palma ou apenas nos dedos ou em locais ectópicos como nódulos de Garrod IFP (dorsal) ou no punho[(17].Na maioria a doença progride lentamente, durante anos. Cerca de 50% dos doentes com nódulos desenvolvem cordas, e destes apenas alguns necessitam de tratamento cirúrgico. A bilateralidade está presente em aproximadamente 59% dos homens e 43% das mulheres com a doença. Em 5% dos indivíduos pode associar-se à fibromatose plantar, doença de Ledderhose, e em 3% à fibromatose peniana, doença de Peyroni[16,17].



Figura 3. Evolução clínica da doença de Dupuytren.
TRATAMENTO
Observação

Tal como já referido anteriormente, a DD geralmente desenvolve-se lentamente ao longo de vários anos e pode não progredir até ao seu máximo potencial. A chave encontra-se na observação do doente até que eventualmente atinja alguma limitação funcional requerendo uma intervenção mais agressiva[16].
Fisioterapia e Talas gessadas

Há referência na literatura ao uso de fisioterapia ou talas gessadas no tratamento da doença, contudo os estudos realizados demonstraram que isoladamente estas técnicas são ineficazes, podendo ser úteis contudo no período pós-cirúrgico[18].
Injeção intralesional de Triancinolona

Trata-se de um corticoide, e o fundamento para a sua utilização advém dos bons resultados observados com a injeção de Triancinolona em cicatrizes hipertróficas e queloides (também ricos em colagénio) [19]. Ketchum e Donahue [20], com 3,2 injeções por nódulo obtiveram regressão da doença em 97% dos casos, contudo com 50% de recorrência 1 a 3 anos após a última injeção. O benefício é superior nos estádios mais iniciais da doença – nódulos e cordas ainda com pouca contração. Os principais efeitos laterais consistem na atrofia da pele e despigmentação típicas dos corticoides, que normalmente resolvem ao fim de 6 meses


Injeção intralesional de Colagenase

Derivada do Clostridium histolyticum, promove a lise do principal componente das cordas – colagénio(Figura 4). Em 2012Witthaut et al[21] analisaram a eficácia da colagenase na DD em mais de 800 articulações, usando uma média de 1,2± 0.5 injeções por corda , e relataram sucesso clínico em 57% dos casos. O sucesso foi superior quando a articulação atingida era a MCF comparativamente à IFP (70% vs37%). O benefício é superior nos estádios Figura 3. Evolução clínica da doença de Dupuytren. Mais iniciaisda doença. A melhoria na contração foi de 55° na MCF e 25° na IFP. Outros estudos realizados anteriormente demonstraram resultados semelhantes [22-30]. Faltavam dados sobre a recorrência, contudo recentemente foi efetuado um estudo avaliando mais de 1000 articulações [22]. Ao fim de 3 anos observou-se 35% de recorrência nas articulações que haviam obtido uma contração de 0 a 5° após o tratamento (27% MCF vs 56% IFP) comparativamente a uma recorrência a de 50% nas articulações com correção apenas parcial após o tratamento (também aqui a recorrência foi superior nas articulações IFP relativamente às MCF).
A taxa de complicações foi baixa, com ruptura de tendão inferior a 1%.



Figura 4. Injeção intralesional de colagenase


Fasciotomia Percutânea

A secção da corda com uma agulha de forma percutânea representa um método capaz de proporcionar uma melhoria funcional significativa, sobretudo da articulação MCF, com uma baixa taxa de complicações, contudo com uma elevada taxa de recorrência. Rijssen et al. compararam os resultados da fasciotomia percutânea com os da fasciectomia seletiva e obtiveram uma melhoria de 76% no défice de extensão, semelhante ao resultado obtido com

a  fasciectomia seletiva. Num follow-up de 5 anos houve recorrência em 85% dos casos tratados comfasciotomia percutânea versus uma recorrência de 24% na fasciectomia. Contudo a fasciotomia percutânea pode ser uma opção nos casos iniciais da doença (<90% défice extensão) e em doente com contraindicação cirúrgica[31,32].

Fasciotomia Percutânea associada à Triancinolona

Recentemente, em 2012, McMillan e Binhammer [33] compararam a associação de injeções de triancinolona com a fasciotomia percutânea com o uso isolado da fasciotomia percutânea, e obtiveram resultados estatisticamente significativos com o primeiro grupo apresentando uma correção de 87% no défice total de extensão ativa comparado com uma correção de 64% no segundo grupo.

Tratamento cirúrgico Indicação cirúrgica

Embora alguns autores defendam o tratamento cirúrgico aquando do surgimento de qualquer limitação funcional associada à doença, na literatura mais recente há algum consenso quanto à indicação cirúrgica quando há contração em flexão da articulação MCF ≥ 30º e qualquer grau de contração em flexão da articulação IFP (embora usualmente aceitem a indicação cirúrgica a partir de 15º)[17].

Métodos cirúrgicos

Vários são os métodos descritos na literatura: fasciotomia, fasciectomia segmentar, fasciectomia radical, fasciectomia seletiva, dermofasciectomia e nos casos mais severos amputação/artrodese.Poucos estudos existem comparando os diferentes métodos de tratamento cirúrgico.O método selecionado deve ter em conta o doente e a experiência do cirurgião com cada método.Contudo vários avaliam o benefício do tratamento cirúrgico de uma forma global.Em 2012 Werker et al[34] avaliaram 218 estudos, cada um deles com pelo menos 20 doentes. A principal dificuldade encontrada reside na multiplicidade de valores usados para definir correção da contratura e recorrência da doença, sendo que em muitos casos são usadas escalas qualitativas. A percentagem de doentes que alcançou a correção da contratura variou de 15 a 96% para a fasciectomia. Essa percentagem não foi determinada para a fasciotomia. A recorrência variou de 12 a 73% para a fasciectomia e de 33 a 100% para a fasciotomia.A fasciotomia e a fasciectomia segmentar embora menos invasivas e permitindo uma recuperação funcional precoce parecem estar associadas a maior taxa de recorrência[35].A fasciectomia radical, removendo tecido doente e tecido saudável, potencialmente causador de recorrência, foi largamente abandonada pela elevada taxa de complicações e percentagem de recorrência semelhante aos restantes métodos menos invasivos[35].A fasciectomia seletiva (Figura 5) é o método mais utilizado atualmente. Um método semelhante mas envolvendo a remoção da pele adjacente é a dermofasciectomia, pois alguns acreditam que possa prevenir a recorrência. Contudo os estudos efetuados não demonstram vantagem deste método relativamente aos em termos de recorrência[36].Relativamente à articulação IFP, para a qual se defende tratamento cirúrgico mais precoce, alguns autores defendem a remoção da cápsula da articulação, contudo não existem dados apoiando ou rejeitando esta opção.A DD pode conduzir limitação funcional severa e resistente ao tratamento cirúrgico. Nestes casos e em casos de complicações, algumas pós-cirúrgicas, com a lesão vascular pode estar indicada a artrodese ou mesmo a amputação.Um estudo revelou que 39% das amputações eletivas de dedos da mão foram secundárias a DD, todas ao nível do 4º e 5º raios, das quais 92% em recorrência da doença. Demonstrou ainda que de todas as cirurgias efetuadas por DD, 2% foram amputações eletivas[37,38].

Complicações

As principais complicações reportadas após a cirurgia são as dificuldades de cicatrização (23% dos casos), dor (18%), lesão vascular (2%), lesão nervosa (3%), infeção (2%)[17 ]. A taxa de complicações aumenta nos casos com contração mais severa e nas reintervenções por recorrência[39].Alguns pontos a ter em atenção de forma a evitar algumas complicações são o isolamento e proteção do feixe vasculo-nervoso, que como referido anteriormente pode encontra-se deslocado em direção à linha média do dedo, e a atenção com a hemostase pois o hematoma pode ser uma complicação importante e causa de alguns dos problemas acima mencionados.







Figura 5. Abordagem cirúrgica na fasciectomia seletiva na doença de Dupuytren.


Recorrência


Embora se defina geralmente recorrência como doença em local previamente submetido a cirurgia, e extensão da doença como o seu surgimento em local previamente são, na prática esta distinção é complexa.
Como já referido anteriormente a recorrência pós cirúrgica é considerável e os doentes devem ser alertados que a cirurgia não representa uma cura para a doença e que outras intervenções podem ser necessárias.
A disseção cirúrgica num local previamente intervencionado é mais complexa e com percentagens de complicações mais elevadas, por vezes com lesão vascular irreversível requerendo amputação. Alguns cirurgiões preferem a dermofasciectomia, artrodese ou mais raramente amputação para a cirurgia por recorrência da doença[40,41].

PROGNÓSTICO

Alguns fatores foram associados a pior prognóstico e maior risco de recorrência: sexo masculino, surgimento da doença antes dos 50 anos de idade, descendência norte europeia, um ou mais familiares afetados, bilateralidade da doença, presença de Nódulos de Garrod (sobretudo ao nível da IFP dorsal) e atingimento da articulação interfalângica proximal. Quando todos estes fatores estão presentes o risco de recorrência é de 71% comparativamente com risco de recorrência de 23% quando nenhum dos fatores está presente[42].


CONCLUSÃO

Quando se fala da doença de Dupuytren fala-se de uma patologia comum e potencialmente incapacitante, podendo impossibilitar o doente, muitas vezes jovem, de realizar as mais simples tarefas da vida diária. Hoje sabe-se que há uma clara predisposição genética para o desenvolvimento da doença, devendo o doente ser alertado que os genes não se curam e que portanto é expectável a recorrência da doença. Embora a cirurgia não represente uma cura, tem notáveis benefícios funcionais, mas tendo em conta que a doença pode evoluir durante décadas ou em alguns casos jamais provocar limitação funcional, torna-se fundamental ponderar o melhor momento para intervir. Há algum consenso quanto à indicação cirúrgica para uma contração superior ou igual a 30º para a articulação MCF e 15º para a articulação IFP. Quanto aos tratamentos não cirúrgicos, apesar das elevadas taxas de recorrência a que parecem associar-se, podem ter algum papel nos estádios iniciais da doença, nos nos doentes com contraindicação cirúrgica ou em associação a outros métodos cirúrgicos e não cirúrgicos. Apesar de descrita há algumas centenas de séculos novos conhecimentos continuam a surgir sobre a doença e várias são os caminhos em aberto para novas descobertas.


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Doença de Dupuytren
A doença de Dupuytren é um espessamento anormal do tecido por baixo da pele da palma da mão, podendo estender-se aos dedos.

Forma tipicamente nódulos (pequenos papos) e cordas que impedem que os dedos estiquem normalmente.

Foi descrita em 1832 pelo Barão Guillaume de Dupuytren tendo ficado com o seu nome.

A causa da doença de Dupuytren é desconhecida sendo mais frequente em populações do norte da Europa e nos homens.

Sintomas

A doença não costuma causar dores.

Inicialmente origina nódulos na palma que se podem estender e originar cordas espessas aderentes à pele que impedem o normal abrir dos dedos (contratura).

A incapacidade para abrir os dedos origina dificuldades para o doente ao lavar-se, colocar luvas, cumprimentar outras pessoas e colocar a mão no bolso.

A doença atinge mais o dedo anelar e dedo mínimo, tendo geralmente evolução lenta durante anos, mas também pode ter uma evolução mais rápida e causando contratura severa dos dedos da mão.

Diagnóstico

É feito pela história e exame físico do doente não sendo geralmente necessário exames complementares de diagnóstico.

Tratamento

Nos casos ligeiros e iniciais sem atingimento da função da mão apenas é necessário seguimento clínico sem cirurgia.

Nos casos em que os nódulos são dolorosos ou em que a incapacidade de abrir os dedos afeta a função da mão é necessário um tratamento cirúrgico. Este tratamento pode ser feito por técnicas mini-invasivas (picadas com agulha) ou com necessidade de abertura da pele conforme os casos e a experiência do cirurgião. O tratamento melhora a função da mão e permite a abertura dos dedos, no entanto, é possível o reaparecimento da doença, principalmente em doentes mais novos.

Fascite palmar

Doença hereditária comum, em que um ou mais dedos se contraem para dentro da palma da mão. Geralmente inicia-se com o aparecimento de um nódulo junto ao dedo anelar, com a evolução, outros nódulos surgem levando à contracção e retracção dos tendões dos dedos, flexionando-os.

Fasciectomia palmar

é o procedimento cirúrgico efectuado através de incisão na pele da palma da mão e, consiste na libertação das estruturas da mão dos nódulos e cordões fibrosos que se formam na Doença de Dupuytren, de modo a evitar a total retracção dos dedos.





A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias é o nome oficial da religião chamada frequentemente de Igreja Mórmon. Acreditamos em primeiro lugar que Jesus Cristo é o Salvador do mundo e o Filho de Deus.

Bispo MORMON Venâncio Caleira 

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