Em 1999, o mundo conhecia o gin Hendrick's e, com ele,
uma história que nos embrenha na verdejante Escócia do século XIX, num período
fascinante, a época vitoriana. Uma narrativa que envolve rigor para encontrar
um equilíbro de sabores inusitado, complexo, embora suave e subtil. Mas também
o de uma bebida que viaja a um mundo peculiar e extravagante.
As terras altas da
Venezuela, na América do Sul, são um território de florestas tropicais densas,
povoadas de mistério, montanhas abruptas e rios que serpenteiam sob a fronde do
arvoredo. Um mundo exótico que há muito atrai apaixonados pela fauna e flora
riquíssimas. Em 2013, a britânica Leslie Gracie atravessou o Atlântico, desde a
Escócia, para se juntar ao explorador venezuelano Charles Brewer-Carias e ao
seu conterrâneo, o botânico Francisco Delascio. O primeiro, conhecedor da
floresta amazónica, o segundo, experiente estudioso da flora da região. O trio
embrenhou-se por dez dias na selva. Leslie procurava sementes, raízes, flores e
frutas. Consigo, levava um pequeno alambique. No calor tropical, frente ao
espanto de uma tribo amazónica, Leslie destilou os elementos botânicos
recolhidos nos dias anteriores. Um odor único embrenhou-se nas copas das
árvores. A seis mil quilómetros da destilaria escocesa da Hendrick's onde é
Master Distiller desde 1998, Leslie captou o espírito complexo dos elementos
botânicos do Novo Mundo. A mulher que se juntou à destilaria que revolucionou a
forma como bebemos e percebemos o gin, adicionou novos ingredientes ao complexo
catálogo de botânicos de uma casa cujas origens remontam ao século XIX e a uma
saga familiar.
Um novo e irrequieto mundo
A aventura
sul-americana de Leslie, uma química de formação e especialista em sabores,
teve um carácter inusitado, o mesmo é dizer raro, ao juntar ao fascínio da
descoberta, a curiosidade e a reinvenção. Neste século XXI, Hendrick's mantém um espírito idêntico
àquele que, em plena época vitoriana, levou o escocês William Grant e os seus
sete filhos e duas filhas a erguerem uma destilaria no seu país natal. O ano,
1886; o local, Girvan, na verdejante e fresca costa ocidental do país. As Ilhas
Britânicas viviam, então, num novo e irrequieto mundo. As cidades cresciam, a
indústria abria a porta a novos produtos, a literatura ganhava nomes como o de
Charles Dickens, inventava-se o Futebol, a fotografia desafiava as artes
convencionais, animais e plantas exóticas invadiam o quotidiano, vindos dos
quatro cantos do mundo. Um tempo de fascínio que deixaria rasto nas décadas
posteriores.
“O diabo está nos detalhes”
Cem anos medeiam entre
a construção da destilaria por William Grant e a decisão do seu bisneto,
Charles Gordon, em adquirir, corria o ano de 1966, dois alambiques pouco
comuns. Por 33 anos, o alambique Carter Head e o seu par, o alambique Bennet,
descansaram antes de lhes ser dado um destino. Este, chegaria em 1998, quando
Charles Gordon contrata Leslie Gracie para desenvolver um novo gin. Em 1999, o
mundo conhecia o gin Hendrick's e com ele, uma nova celebração para uma bebida
centenária, destilada à base de cereais, passando por um processo de infusão
com zimbro e outros botânicos.
Produzido com 11
botânicos, entre eles a camomila, sementes de coentro e de cominho, flor de
sabugueiro e raiz de lírio Hendrick's adiciona ao seu gin dois
ingredientes que o fazem uma peça singular: a essência de pepino e as
fragrantes rosas. O resultado é um gin complexo, embora de travo subtil e
suave, num jogo de desafio para as papilas gustativas.
Um
dos símbolos da Hendrick's Gin, o duplo alambique adquirido em 1966 por Charles
Gordon, bisneto do fundador de uma destilaria na Escócia. créditos:
Hendrick's
É uso dizer-se que “o
diabo está nos detalhes” ou, no caso concreto, em todo o complexo processo de
manufatura de um gin preparado em pequenos lotes de 500 litros para se
aconchegar numa garrafa desenhada ao pormenor e que nos remete para as antigas
garrafas medicinais. Na origem, o gin e o seu espírito eram tidos como um
bálsamo para inúmeras maleitas. Hoje, é uma bebida de celebração, e encontros,
de otimismo e alegria. Para desfrutar tão simples quanto possível, com água
tónica, umas pedras de gelo, embora com o toque inusitado que Hendrick's pede:
sirva-o num copo largo, dispense a rodela de limão e substitua-a por uma rodela
de pepino. Decore com pétalas de rosa e algumas bagas de zimbro. E, se o
caminho for fazer do gin inspiração para cocktails, prepare-os com o
espírito de festa e de originalidade.
Este ano, ao oferecer gin Hendrick's não
o deixe órfão desta história. Conte-a à família e amigos, tempere-a com a
efervescência e surrealismo da época vitoriana, recorde Leslie Gracie e o seu
gabinete de curiosidades instalado no Palácio do Gin Hendrick's e onde a
especialista em botânicos exerce a magia da criação de novos sabores.
Finalmente, deambule pelas aventuras amazónicas e escocesas, pela fragrância
das rosas e a excentricidade do pepino, ao preparar um gin para quem lhe está
próximo.
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