sábado, 18 de novembro de 2023

DALÍ E GALA - HISTÓRIA DE UM AMOR INCOMUM

Hoje venho falar-vos do amor sui generis de Salvador Dalí e daquela que ficou conhecida simplesmente por “Gala”. Ele não carece de apresentações. Foi, como se sabe, um dos mais importantes pintores surrealistas. Gala foi a mulher de Dalí, a sua deusa, a sua musa (Palavras do próprio).

 Nascido Dalí Salvador Domingo Felipe Jacinto Dalí i Domènech na Catalunha, Espanha, no dia 11 de maio de 1904, ficou conhecido para a história simplesmente como Dalí. Desde cedo revelou talento para o desenho. Iniciou a sua educação artística na Escola de Desenho Municipal. Em 1921 rumou a Madrid, para estudar na Escola de Belas-Artes de San Fernando. Foi aí que criou amizade com o poeta Frederico Garcia Lorca e com aquele que se tornaria, mais tarde, num famoso cineasta – Luís Buñuel. Já nessa época Dalí chamava a atenção até pela forma como se apresentava, mostrando, também no vestir, a sua personalidade excêntrica: cabelos longos, laço ao pescoço desmesuradamente grande, calças até ao joelho, meias altas, casaco comprido. Acabará por ser expulso da instituição em 1926 pois afirmava que ninguém naquela casa era suficientemente competente para o avaliar. Nesse mesmo ano fará a sua primeira viagem a Paris e, mais tarde, acabará por estabelecer-se lá.

Em Paris irá travar conhecimento com variadíssimos artistas estando, entre eles, o poeta Paul Eluard, à data casado com a russa Helena Ivanovna Diakanova, aquela que a maior parte de nós conhece, simplesmente, por Gala. Nascida na Rússia em 1894, recebeu uma excelente educação tendo-se tornado professora de profissão. Os problemas de saúde causados pela tuberculose levaram-na até à Suíça sendo internada para tratamentos. Será nessa estadia que conheceu Eugène Grindel (que mais tarde adotaria o nome de Paul Éluard). Casou-se com ele em 1917, tendo nascido no ano seguinte a única filha do casa, Céline.

Dalí e Gala conheceram-se em 1929. Sobre esse encontro dirá Dalí, mais tarde que se tinham encontrado ele, René Magritte, Luis Buñuel e os Éluards no hotel Miramar. Tinham conversado, bebido e Dalí até passeara com Gala.

Os amigos apreciavam a companhia uns dos outros e marcaram um encontro para o dia seguinte, na praia, bem em frente da casa de Dalí. No dia seguinte, o toque do campanário indicava 11 horas da manhã e, ouvindo vozes, Dalí inclinou-se  para fora da janela. Foi quando avistou Gala. Dir-se-á que foi neste momento que Dalí “a reconheceu”. Desde a infância o pintor tinha idealizado a “mulher dos seus sonhos”, aquela que lhe aparecia como uma menina com formas e costas bem definidas. Até aquele momento Dalí não tinha tido nenhuma relação amorosa com uma mulher porque, dizia, ainda não tinha encontrado essa mulher idealizada. Não importava ela ser bonita ou feia, ou onde a encontrasse. Importava era encontrá-la.

Quando Dalí viu, da janela do seu quarto, Gala, reconheceu-a pelas costas nuas. O corpo dela ainda tinha a aparência de uma criança. Reconheceu nessa imagem a jovem com que tinha sonhado na sua infância, acreditando que Gala era aquela criança transformada em mulher. Quando foi ter com o grupo foi acometido de um ataque de riso que só terá cessado quando Dalí se confessou apaixonado por Gala, em frente do próprio marido dela. Terão admitido que tinha sido amor à primeira vista. Este não terá demonstrado qualquer ciúme, uma vez que pensou que se tratava de mais um capricho da esposa.  Os dias passaram-se entre passeios e longas conversas na praia. O facto é que quando o grupo partiu, Gala permaneceu com Dalí por mais duas semanas dando início a um relacionamento que irá durar até à morte dela. Em A vida secreta de Salvador Dalí, o pintor lembra a primeira vez em que se beijaram apaixonadamente, abrigados por uma pedra, confessando que nunca, até aquele momento, tinha feito amor na vida.

Ficaram, desde então, inseparáveis e, quando o divórcio com Éluard foi oficializado, casaram-se.

Em 1934, o casal viajou para os EUA onde Dalí inauguraria a sua exposição. Gala, sempre muito perspicaz, achava que seria lá que ele iria receber o verdadeiro reconhecimento e ficar rico. Não se enganou.  Ali chegado conseguiu vender os seus quadros por preços exorbitantes o que permitiu ao casal viver uma vida de luxo.

Mais ou menos 6 anos depois da primeira visita aos EUA, o casal voltou a esse país, tendo lá permanecido por 8 anos (aquando da IIª Guerra Mundial). Nessa época trabalharam sem descanso. Ele pintava quadros, escrevia roteiros, chegou a fazer o cenário de um filme para Alfred Hitchcock e até vitrines decorou. Fazia o possível para conseguir dinheiro. Ela, por outro lado, agia como o seu agente, procurando constantemente novos contratos.

Em 1948 voltaram para Espanha. Dalí sentia muitas saudades do seu país. Nessa época tinham fama, dinheiro e sucesso. Mantinham um casamento que, não podemos negá-lo, tinha muito pouco de convencional. Ele tinha medo de mulheres e de relações íntimas (dizem algumas pessoas que Gala era a única mulher que podia tocá-lo). Já ela, era sensual e apaixonada. Cedo começou a saciar os seus desejos com muitos jovens amantes a quem enchia de presentes caros. Contudo, o seu relacionamento com Dalí não ficava beliscado por esses amantes que Gala colecionava. A relação deles estava acima desses desejos do corpo. Um livro de memórias de uma irmã de Gala descreve o relacionamento deles referindo que Gala cuidava de Dalí como se ele fosse uma criança: lia para ele antes de dormir, obrigava-o a tomar os remédios necessários, analisava, com infinita paciência, os seus pesadelos. No fundo ela atuava como uma mãe e ele como um filho e ambos se sentiam bem nesses papéis.

Prova de que um amor profundo mantinha este casal foi o casamento, pela igreja, em 1958. O casamento anterior tinha sido apenas civil. Tantos anos depois desse primeiro casamento, o casal achou necessário a igreja abençoar aquela união que durou mais de meio século.  A verdade é que eles tinham um amor construído nas suas peculiaridades mas que era verdadeiro para eles e, como tal, lhes fazia sentido.

Numa das muitas excentricidades conhecidas de Dalí, este comprou à mulher, em 1959, o Castelo de Puból, que decorou em sua homenagem. Gala passou a viver lá e Dalí só podia entrar nele com a permissão, escrita, da esposa. Será nesse castelo que Gala morreu e foi enterrada em 1982, num caixão com tampa transparente. Dalí viveu sem o seu grande amor por mais 7 anos, nesse mesmo castelo até ele ter disso destruído por um incêndio. Sobreviveu a Gala numa depressão profunda e afetado por complicações causadas pelo Parkinson. Virá a falecer em 1989 com 84 anos. Deixou toda a sua fortuna, incluindo os seus quadros, a quem ele amou, provavelmente, tanto como Gala: Espanha.

O facto é que Gala foi a mulher da vida de Dalí. Foi nela, mulher 10 anos mais velha do que ele, que o pintor encontrou a musa sonhada, a amiga, a mulher.

Dalí e Gala amaram-se até ao final da vida com um amor capaz de ultrapassar as regras mais comuns da existência. Para Dalí, Gala era o seu génio, a sua deusa vitoriosa. Quanto a Gala, à sua maneira, também amou Dalí até ao último dos seus dias. Teríamos tido aquele génio da pintura se ela não tivesse sido, ao longo da vida a dois, o seu apoio, o seu agente, a “mãe” de que ele tanto precisava?

Termino este texto com as palavras de Dalí:

Gala trouxe-me, no verdadeiro sentido da palavra, a ordem que faltava à minha vida. Eu existia apenas num saco cheio de buracos, mole e delicado, sempre à procura de uma muleta. Ao juntar-me a Gala, encontrei a minha coluna vertebral e, ao fazer amor com ela, preenchi a minha pele.” (Dalí)


CREDITS - "Je t'aimais, je t'aime, je t'aimerais" 

 Histórias de Amor Intemporais



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